O Respeito na ótica do cliente disruptivo
- Por Jacques Meir
- 5 min leitura
undador e atuante no ecossistema de startups dos EUA, professor brasileiro na Harvard Business School e também na Universidade de San Diego: “o cliente é disruptivo, não as startups ou as empresas.” A afirmação dele carrega uma aparente simplicidade, mas chama atenção para o fato, cristalino, de que toda inovação disruptiva nasce, de fato, a partir de dores que o consumidor sente em sua jornada transacional e relacional com uma empresa. Normalmente, os negócios criam rotinas que levam o cliente a assumir diferentes tarefas para ter acesso a um produto ou serviço. Quanto mais essas tarefas consomem tempo ou tornam-se difíceis, mais atrito geram para o cliente e mais criam espaço para movimentos disruptivos. Uma startup que analisa esses pontos de atrito e enxerga ali uma oportunidade de criar um negócio novo, coloca em marcha a disrupção demandada, ainda que de forma inconsciente, pelo consumidor.
O trabalho das lideranças, das empresas incumbentes e das startups hoje é mais perigoso. Ele traz uma taxa de risco ainda não totalmente mapeada pelo mercado corporativo. Em tese, a uma empresa basta oferecer um produto ou serviço em diferentes canais, da maneira mais conveniente e acessível para o cliente, para então estabelecer uma interação transacional eficaz e que consiga atender às expectativas diversas. Mas esse fundamento de mercado ganhou novos e múltiplos contornos nos últimos tempos. Porque para uma empresa não basta apenas considerar os itens componentes essenciais de uma oferta; ela agora precisa incorporar um contexto ampliado que cerca a oferta e os seus impactos em diferentes agrupamentos de clientes e de expectativas.
Assim, não é suficiente que um requeijão esteja fresco e seja consumido no prazo de validade, comprado por um preço justo e ostente uma marca com boa reputação. Esse requeijão será consumido como uma fonte de informação sensível por diferentes agrupamentos de clientes, cada qual com um interesse específico. Haverá aqueles que se interessam pela informação nutricional do requeijão. Haverá outros que irão contestar a quantidade de sódio ou conservantes. Outros que irão demandar a versão sem lactose ou vegana desse produto. Mais alguns que poderão se interessar pela forma de produção e pelas políticas de apoio aos produtores do leite que serve de matéria-prima ao produto. E por que não considerar aqueles que exigirão um tipo de narrativa mais inclusiva ou ainda saber quais são as posições da empresa e da marca acerca de alguma questão identitária?
Tudo isso, já sabemos, reside no território de informação do pós-consumidor, aquela pessoa eternamente insatisfeita, intolerante e impaciente que, rapidamente, se organiza em redes orquestradas para contestar alguma informação, manifestar uma causa ou pressionar empresas, marcas e pessoas para que mudem posturas ou assumam novas formas de interação ou transação.
Esse território de informação encampa a ideia ampla de Respeito ao Consumidor. Da ideia básica de que basta a uma empresa cumprir o que promete, honrar os acordos de valor que envolvem uma oferta, um produto ou um serviço, hoje essa premissa se expande justamente para um campo de informação sensível. Logo, “cumprir o que promete” e “honrar acordos” significa expandir os limites da oferta e da marca que ela ostenta para diferentes implicações, narrativas e contextos que possam, de alguma forma, criar algum atrito com o cliente. Muitas empresas – e executivos – podem pensar que é um exagero contemplar tantas variáveis para acalmar eventualmente um punhado de clientes insatisfeitos ou curiosos. Mas vale a pena considerar que um ponto em aberto, um pequeno ponto descoberto nessa jornada do cliente, que inclui um território de informação não mapeado na plenitude, leva uma startup – ou uma empresa competidora qualificada – a criar uma inovação que responda a essa demanda. Pronto, em pouco tempo uma liderança incontestável pode se tornar uma dor de cabeça incontornável. Sempre vale lembrar que portas giratórias em agências bancárias serviram de inspiração para a criação do Nubank ou que lâminas de barbear, guardadas em cofres de plástico, serviram de motivação para a criação do Dollar Shave Club.
Muitos outros negócios foram – e serão – criados com base nessa nova ótica do Respeito ao cliente, que engloba as muitas narrativas associadas ao território de informação elementar de uma oferta específica. Entender objetivamente qual é a elasticidade desse campo de informação sensível e o quanto ele pode impactar um produto e sua jornada de interação transacional com o cliente.
Assim, o Respeito ganha novas dimensões que devem ser mapeadas pelos gestores, de modo cuidadoso. Essas dimensões estão claramente relacionadas aos territórios de informação que se agregam espontaneamente – na ótica do cliente – e são agregados estrategicamente – na ótica da empresa – às ofertas de produtos e serviços e, também, das marcas. Assim, além de buscar a orquestração de canais e audiências nas interações transacionais, cabe aos gestores de CX/Clientes/Marketing desenvolver a curadoria da informação que se associa às ofertas. Desta forma, será possível atender aos requisitos e às expectativas dos clientes em relação à sua percepção de respeito.
Sim, estamos no auge de uma era de imensa complexidade para todos aqueles envolvidos na gestão de clientes. Compreender o alcance que o Respeito ao cliente ganha nesse momento é criar bases para resistir e responder às disrupções que, eventualmente, surjam nas lacunas da jornada do consumidor ou até mesmo detectar oportunidades que façam uma empresa potencializar vantagens competitivas e inovações para ganhar a preferência, a recorrência e a satisfação absolutas do cliente.
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