Estamos vivendo uma epidemia de cansaço
- Por MARINA ROALE
- 3 min leitura
SE VOCÊ NÃO SENTIU ANGÚSTIA, ansiedade ou uma certa improdutividade na última semana, talvez já possa patentear uma receita de milhões de dólares. Afinal, tais sentimentos se tornaram tão comuns nesses tempos caóticos que toda hora vemos alguma palavra nova para diagnosticar sensações coletivas negativas pautando notícia por aí. A OMS, por exemplo, já vem adotando o termo fadiga pandêmica para falar do esgotamento gerado pela hipervigilância e pelo medo de um vírus que não se pode ver.
Já o The New York Times foi além, e resgatou um conceito da psicologia para nomear uma sensação de estagnação e vazio que se espalha entre as pessoas no cenário atual. O nome languishing se refere a um estado de definhamento que se localiza entre a depressão e o bem-estar. Não à toa, saúde mental foi um termo que bateu recorde de buscas nessa quarentena e já é uma pauta superpresente nas rodas de debate da Geração Z.
O fato é que o elemento pandemia, com toda sua montanha-russa de incertezas, só catalisou uma sociedade que já vinha dando fortes sinais de cansaço. Desde 2010, o filósofo sul-coreano Byung-Chul Han fala de um mundo onde se vive com a angústia de achar que não fazemos tudo o que poderia ser feito. Nele, impera a ditadura de uma positividade tóxica, na qual cada indivíduo se torna empreendedor de si mesmo. “Trabalhe por você, seja sua melhor versão!”.
Isso resulta na sociedade do desempenho, um lugar onde todos buscam alta performance validada por likes, reviews e scores – a boa métrica é o que importa. Não há tempo a perder. Os sistemas de gamificação não estão mais só dentro dos apps de promoção ou dos serviços inovadores do Vale do Silício. Há sempre uma nova fórmula, método ou planejamento prometendo alguma melhora na produtividade.
O mais intrigante é que, mesmo diante de um inimigo invisível que nos força a parar, suspender o futuro e recalcular a rota, tentamos continuar produzindo e inovando. Parar de produzir seria como desistir de viver. O velho clichê de que crises trazem oportunidades foi o mantra dos gurus pandêmicos. Em pouco mais de um ano, vidas foram transformadas: a jornada de trabalho e de gestão da casa se fundiram com os novos hábitos de consumo.
Nos reinventamos, é verdade, mas estamos exaustos. Eu, você, seus colaboradores e seus consumidores. E até quando desejaremos aquilo que nos gera mais ansiedade em vez de serenidade?
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