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Por que as mulheres usam menos IA do que os homens?

Por que as mulheres usam menos IA do que os homens?

Estudo mostra que mulheres usam 25% menos IA generativa que homens, e aponta riscos para equidade no trabalho e evolução tecnológica.

Ao mesmo tempo em que a Inteligência Artificial (IA) surgiu para impulsionar a produtividade no trabalho, um novo alerta surge: as mulheres estão menos propensas a adotar ferramentas de IA generativa, como o ChatGPT, do que os homens. Essa diferença, longe de ser um detalhe, pode aprofundar as desigualdades de gênero no ambiente profissional e comprometer ganhos econômicos amplos, segundo um estudo publicado pela Harvard Business School.

“Há sempre uma grande disparidade de gênero escondida por trás desses artigos que celebram os avanços da IA”, afirma Rembrand Koning, professor associado da instituição e autor do artigo “Evidências Globais sobre Lacunas de Gênero e IA Generativa”. A pesquisa, conduzida por Koning e colegas da Universidade da Califórnia em Berkeley e da Universidade de Stanford, revela que as mulheres têm adotado ferramentas de IA em uma taxa 25% menor do que os homens, mesmo quando os benefícios aparentes são os mesmos para ambos.

Adoção desigual, preocupações diferentes

Para chegar a uma conclusão, os pesquisadores analisaram 18 estudos com mais de 140 mil participantes em países como Estados Unidos, China, México, Suécia e Marrocos. Os grupos incluíam estudantes universitários, empresários, analistas de dados, desenvolvedores e executivos. O padrão era claro: as mulheres tinham de 10% a 40% menos probabilidade de usar IA generativa.

“Quando os agregamos, nossa melhor estimativa é que haja uma lacuna de 25%”, pontua Koning. Apenas um estudo – uma pesquisa do Boston Consulting Group com trabalhadores de tecnologia da área de São Francisco – descobriu que as mulheres tinham 3% mais probabilidade de usar IA do que os homens. “Mulheres na área de tecnologia podem ter tido mais exposição a essas ferramentas e se sentem mais confortáveis ​​em usá-las”, acrescenta.

Os pesquisadores também analisaram o uso da IA com base no gênero e constataram que, entre novembro de 2022 e maio de 2024, as mulheres representaram apenas 42% dos 200 milhões de usuários mensais médios do site do ChatGPT. A diferença foi ainda maior nos aplicativos para smartphones: apenas 27% dos downloads do app ChatGPT partiram de usuárias do sexo feminino.

Segundo Koning, os motivos vão além da familiaridade com a tecnologia. Em entrevistas e análises qualitativas, as mulheres expressaram receios éticos e medo de serem julgadas negativamente por usarem uma ferramenta que pode ser percebida como “trapaça”.

“As mulheres enfrentam penalidades maiores ao serem julgadas como não tendo experiência em diferentes áreas”, afirma. “Elas podem estar preocupadas que alguém pense que, mesmo tendo acertado a resposta, elas ‘trapacearam’ ao usar o ChatGPT.”

Efeitos colaterais para empresas e economia

A lacuna de adoção tecnológica entre homens e mulheres não é apenas uma questão de inclusão: ela pode impactar diretamente a produtividade e o crescimento econômico.

Além disso, a baixa participação feminina limita o próprio desenvolvimento da Inteligência Artificial. Os grandes modelos de linguagem se aperfeiçoam com base em interações e sugestões dos usuários. Ou seja, quanto mais diversas, melhores os resultados. “Se estiver aprendendo predominantemente com homens, isso faz com que essas ferramentas respondam de forma diferente ou sejam tendenciosas de maneiras que possam ter efeitos a longo prazo?”, questiona o pesquisador.

A baixa participação das mulheres pode levar à criação de sistemas que reforçam estereótipos de gênero e falham em reconhecer as desigualdades que elas enfrentam, como disparidades salariais e a sobrecarga com tarefas de cuidado.

Como diminuir a lacuna?

Para o pesquisador, é preciso ir além do fornecimento técnico da tecnologia e atuar sobre a cultura organizacional. Apenas dar acesso não resolve. É necessário criar um ambiente psicológico seguro para que todas se sintam encorajadas a explorar as ferramentas.

Ele sugere treinamentos obrigatórios sobre IA, que promovem o uso ético e produtivo, e uma comunicação clara por parte da liderança. “Ao conversar com empresas sobre o uso da IA ​​generativa, os lugares onde as lacunas parecem ser menores são aqueles em que os líderes dizem: ‘Queremos que todos adotem essas ferramentas. Algumas coisas vão funcionar e outras não, e tudo bem'”, destaca. “Se você fizer isso, estará contribuindo muito para diminuir a lacuna na adoção.”

Não é sobre capacidade, é sobre acesso e incentivo

Ariane Reiser, head de IA e Performance Digital da consultoria ConquestOne.

Enquanto pesquisas da Harvard Business School revelam uma lacuna de gênero na adoção de ferramentas de Inteligência Artificial, especialistas do mercado brasileiro apontam que essa desigualdade já é visível na prática. Para Ariane Reiser, head de IA e Performance Digital da consultoria ConquestOne, a menor adoção da IA por parte das mulheres está relacionada a um conjunto de fatores estruturais, e não à falta de competência.

“Percebo essa diferença de adoção no dia a dia das organizações, assim como observo uma presença menor de mulheres nas áreas STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática)”, afirma Ariane. “Apesar dos avanços significativos na participação feminina em disciplinas técnicas e nas ciências naturais, os números ainda são proporcionalmente baixos quando comparados aos dos homens nessas áreas.”

De acordo com a especialista, esse cenário reflete diretamente na adoção de ferramentas de IA, porque muitas mulheres se mantêm mais distantes da experimentação e do uso efetivo dessas tecnologias, especialmente em contextos que exigem maior familiaridade com dados ou envolvem aspectos mais técnicos.

“Isso ocorre até mesmo em cargos de liderança, onde a tomada de decisão poderia ser amplamente enriquecida pelo uso estratégico da IA. Importante ressaltar que essa menor adoção não é uma questão de capacidade – as mulheres são plenamente capazes de dominar essas tecnologias. O que muitas vezes falta é acesso, incentivo e, sobretudo, o hábito de incorporar essas ferramentas na rotina”, frisa.

Sensibilidade ética como força

A pesquisa também aponta que questões éticas pesam mais para mulheres, o que pode ser um dos fatores que inibem a adesão à IA. Ariane acredita que essa sensibilidade é fruto de vivências sociais e profissionais. Por isso, mulheres tendem a ser mais sensíveis às implicações humanas e sociais das tecnologias.

“Questões como viés algorítmico, privacidade e impacto social pesam mais justamente porque muitas mulheres já vivenciaram desigualdades e preconceitos em diferentes contextos. Isso gera uma preocupação genuína: ‘Será que essa tecnologia reforça ou combate desigualdades?’. Essa sensibilidade ética é uma fortaleza, e não um obstáculo. Mas, pode inibir a adoção quando não há clareza sobre os mecanismos de governança e mitigação desses riscos”, explica.

Ao mesmo tempo, a IA tem redefinido fluxos de trabalho, competências e até a forma como decisões são tomadas. A especialista alerta que, quem não se familiarizar com essas ferramentas, corre o risco de perder espaço em processos decisórios, em inovação e, consequentemente, em oportunidades de crescimento profissional.

“Para as mulheres, isso pode significar uma ampliação das desigualdades de carreira, já que muitas funções serão redesenhadas para incluir habilidades digitais. Não se trata de virar especialista técnica, mas de saber usar a IA como aliada estratégica no seu campo de atuação”, destaca.

Mais mulheres na IA: o papel das empresas

Para evitar que a lacuna de gênero se amplie, Ariane defende uma abordagem ativa das organizações. Ela reforça que as empresas precisam olhar para a diversidade digital com a mesma seriedade que tratam outros temas de inclusão. Isso inclui oferecer treinamentos com recorte de gênero, criar ambientes seguros para experimentação e promover mentorias com outras profissionais que já usam IA.

A especialista destaca ainda que a liderança tem papel decisivo nesse processo. “Líderes precisam modelar o comportamento que desejam ver, usando IA de forma ética e transparente. Além disso, devem promover uma cultura de aprendizado contínuo, onde a curiosidade seja incentivada e o medo de errar ao adotar novas tecnologias seja reduzido. Quando a liderança reconhece publicamente os avanços das mulheres nesse campo, reforça que elas pertencem a esse espaço”, pontua.

Iniciativas em prol de mais mulheres na IA

Algumas iniciativas têm funcionado bem para aumentar a participação feminina em IA. Entre elas, Ariane destaca comunidades de prática feminina em IA, como grupos de networking e mentorias específicas; programas de mentoria cruzada, conectando mulheres de áreas diversas a especialistas em IA; e casos de uso aplicados ao contexto das profissionais. Esse último mostra como a Inteligência Artificial pode resolver problemas reais no dia a dia – como no RH, marketing, jurídico, procurement – e não apenas exemplos técnicos.

E para as mulheres que ainda se sentem inseguras, ela aconselha: “Não espere se sentir 100% pronta para começar. A IA é uma área em constante evolução, e ninguém sabe tudo. Comece pequeno, testando ferramentas simples, explorando casos de uso no seu campo e, acima de tudo, faça perguntas. Perguntar ‘como isso funciona?’, ‘quais dados alimentam essa decisão?’ já coloca a profissional em posição de protagonismo. A tecnologia está aqui para servir às pessoas, e não o contrário. Participar dessa transformação é garantir que suas perspectivas, necessidades e valores façam parte da construção do futuro digital”, finaliza.

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