Ray Dalio, autor de Principles e um dos investidores e empreendedores mais bem sucedidos da atualidade, estava no SXSW e conversou com Eric Schurenberg, da Mansueto Ventures, sobre sua experiência na Bridgewater Associates, com mais de US$ 60 bilhões em investimentos, empresa que o tornou um dos 100 homens mais ricos do mundo a partir de princípios inegociáveis: sentido de propósito, verdade radical e transparência radical. Um ambiente desenhado para fazer só grandes ideias prevalecerem a partir de uma metodologia de tomada de decisões.
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“Desde o início eu tive o hábito de escrever sobre minhas decisões, justamente para sempre poder consultar o que me levou a tomar as decisões que tomei. E então, depois de muito escrever, consegui determinar princípios para a tomada de decisões. Esses princípios foram inseridos num algoritmo que hoje direciona a tomada de decisões nas empresas com que trabalho. E é sempre importante termos princípios, para saber quais deles são válidos para nós como indivíduos, como executivos, para empresas e governos. Princípios são ferramentas válidas e extremamente importantes para nosso presente e futuro, para entender como a realidade funciona”, testemunhou, com intensidade e clareza notáveis, Ray Dalio, no início do painel.
Princípios essenciais
Os princípios da vida são baseados em objetivos audaciosos, falhas, aprimoramentos, aprendizado e então objetivos ainda mais audaciosos. Esses princípios não se encadeiam em um ciclo perfeito, mas em curvas e tensões. Eles mostram o que podemos aprender com as falhas. Elas são cruciais para aprendermos, e então nos permitem definir novos objetivos. “Todos temos fraquezas e precisamos encarar os problemas de frente, diagnosticar nossas fragilidades e traçar rumos que permitam suplantar os obstáculos. Fazer o design de um caminho que nos permita atingir um objetivo é seguir sempre em frente”, afirmou Dalio. Para ele, uma vida bem-sucedida passa por seguir princípios constantemente, manter-si firme a eles e utilizá-lo como metodologia para a vida e a profissão.
Ray despreza a arrogância dos operadores de mercado. Ele conta como perdeu dinheiro, muito dinheiro na crise de 2008. Mas a crise o ensinou a ser ainda mais humilde para buscar formas de evitar que suas empresas sejam vítimas de processos como esse novamente. Ele criou um framework para aprimorar a tomada de decisões. “Há o que sabemos, o que não sabemos e o que não sabemos tem mais valor do que o que sabemos. Infelizmente ninguém fala sobre falhas para que possamos aprender com eles”.
Meritocracia e humildade
A ideia de meritocracia, princípios que sistematizem boas decisões, o aprendizado com as falhas são um caminho testado e aprovado para o sucesso. E a meritocracia depende de uma empresa saber reconhecer boas ideias. Para isso, as pessoas precisam colocar suas ideias honestamente na mesa – mas como fazer as pessoas terem coragem de se expor dessa maneira? Então, o caminho é explorar de maneira aberta as discordâncias. E é muito bom ouvir discordâncias, é um exercício de humildade que tem tremendo poder. Finalmente, é importante criar acordos que sejam referenciais.
Believability ou credibilidade, decisão baseada em algoritmos
O processo de tomada de decisões da Ray Dalio para por perguntar a cada indivíduo qual o seu apreço por uma ideia, e em que nível essa ideia tem aceitação? O que as pessoas realmente queremos? As pessoas são radicalmente honestas e transparentes em suas respostas? Essas gradações e inclinações são então compiladas por um algoritmo que processa a decisão ideal, capaz de retratar as nuances e inclinações da equipe reduzindo o poder discriminatório.
Eric Schurenberg perguntou de onde vieram os princípios que regem a trajetória de Ray Dalio. Ele diz que sempre procurou carreiras com sentido, pessoas com sentido e que isso o ajudou a fundamentar princípios de vida e de relacionamento. “A discordância existe, e precisamos ter coragem e integridade de entender porque a discordância existe. Motivado pela curiosidade, sempre procurei entender o que a outra pessoas está querendo dizer”. Para ele, diante da discordância, é necessário refletir por poucos minutos antes de responder de forma emocional. Reagir a discordância é um protocolo. E as empresas de Ray seguem protocolos para lidar com a discordância e, dentro do método que suas empresas adotam, as decisões sempre tem como fim o que o algoritmo determina.
Questionado por Schurenberg se o processo não torna a empresa lenta, Dalio diz que simplesmente estava à procura de decisões eficientes e consistentes. A cultura da empresa fomenta transparência radical. As pessoas podem exprimir suas opiniões que elas serão levadas em conta na tomada de decisões o que fará a organização sempre privilegiar boas ideias, baseadas em decisões eficientes.
Podemos ser transparentes uns com os outros
Ray Dalio diz que as empresas precisam escolher ser transparentes umas com as outras, precisam ser humildes para aceitar posições contrárias, mas que no fim do dia, as decisões tomadas serão justas e fruto da transparência de todos. A verdade revela confiança. “Todos podem me julgar, e isso para mim é o máximo de meritocracia”, afirma Dalio. Dalio desafia Schurenberg a opinar sobre seus princípios, se são lógicos. Eric respondeu que sim, os princípios da Bridgewater são incrivelmente lógicos e honestos, o que nos leva a pensar em como seria ver nossas empresas no Brasil direcionadas por decisões baseadas em uma metodologia de tomada de decisões baseada em algoritmos, onde nossa propensão em resignar-se a aceitar a “palavra do chefe” fosse substituída pelo processo de transparência e participação radical.
“A realidade é uma coisa linda, desde que possamos compreendê-la”
E como se constrói uma cultura baseada em princípios? Todos podem aprender com os próprios erros, mas a coisa mais importante é como reagimos diante dos erros. A tragédia da sociedade moderna é punir erros e não questionar a pessoa que falhou o que ela fará no futuro em uma situação semelhante. Essa honestidade precisa fazer parte da cultura. A credibilidade de uma decisão é um produto de opiniões distintas que encontram pontos consonantes que superam as dissonâncias. É um design de tomada de decisão baseada em colaboração, um processo mais sofisticado que a democracia por si só. Essa é a base de uma cultura de princípios e que é capaz de fazer organizações enfrentarem a realidade de modo compreensível: “A realidade é uma coisa linda, desde que possamos compreendê-la”, enfatiza o executivo.
Ray Dalio tem os méritos de construir uma cultura corporativa sólida, que consegue tomar decisões de alto nível continuamente, ponderando vieses e visões diferentes, transferindo o ônus das decisões para um algoritmo capaz de refletir o que as pessoas pensam acerca de um assunto, em benefício da empresa. Sua fortuna é um indicador de que seus princípios têm mérito. Mas sua honestidade intelectual certamente fala mais alto. Há muito o que aprender em sua obra e experiência.
Não seria o caso de vermos parlamentos adotando essa metodologia para que decisões melhores possam ser tomadas na esfera política em favor das pessoas? #ficaadica.