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Quando as empresas confundem valor com vendas

Quando as empresas confundem valor com vendas

"Valor só se traduz em inovação quando as pessoas o reconhecem, não quando satisfaz a empresa. E vender deve ser entendido como consequência desse valor"

“Preço não tem nada a ver com custo”. Nunca mais esqueci essa frase que ouvi do meu chefe quando estagiava em uma empresa de energia. Na época, demorei muito para entendê-la, principalmente porque havia estagiado previamente em uma empresa varejista de moda, na qual o preço de loja de cada produto era resultado direto da margem de lucro somada ao custo de produção (o preço era estabelecido a partir de uma relação direta com o custo, portanto).

Essa equação parecia bastante lógica para alguém que cursava o quinto período de engenharia de produção, treinada sob um pensamento linear e racional, com foco em otimização de processos, tempos e movimentos. Herança da teoria econômica clássica, protagonizada pelo homo economicus, personagem racional que busca maximizar sua satisfação em qualquer situação que envolva escolhas. Segundo ela, fazemos escolhas de acordo com os nossos próprios interesses. No entanto, não é só de razão que vivem nossas decisões. Como já diz a famosa frase de Wilfred Bion: “A razão é escrava da emoção e existe para racionalizar a experiência emocional.

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Somos seres essencialmente emocionais, com algo de razão que nos ofereça sentido. E, por justamente entender que somos “limitadamente racionais”, a economia comportamental abre espaço para a emoção, ao mapear as anomalias em nossos processos de decisão (é por isso que nem sempre conseguimos escolher aquilo que vai nos gerar a maior satisfação possível). Foi somente a partir desse conceito que comecei a entender o significado mais amplo da palavra valor. Valor, definitivamente, não é um conceito racional.

 “O valor de um item não deve se basear em seu preço, mas na utilidade que ele produz.” 1

É dessa frase que surge a noção de que valor tem muito mais a ver com a percepção de utilidade do que com o preço ou com o custo que levou para produzir determinado item. E ainda menos agora que entramos em uma Era líquida, desmaterializada, focada em serviços que resolvem necessidades reais. Mas, para entender por completo essa frase, talvez tenhamos que explorar o que vem a ser “utilidade”.

Segundo Jeremy Bentham, filósofo, jurista e um dos últimos iluministas, difusor do utilitarismo2, utilidade se entende por “…aquela propriedade em qualquer objeto, pela qual ele tende a produzir benefício, vantagem, prazer, bem ou felicidade…”. Ou seja, utilidade se traduz em satisfação. O conceito interessante aqui é que a percepção de utilidade não é igual para todos. Ela difere de acordo com as referências de cada um. Dessa forma, a noção de satisfação irá variar de pessoa para pessoa, em cada situação. Ou seja, “o sentimento rege a medição 1. Por experiência própria, o grau de ansiedade de cada passageiro durante um voo certamente vai variar durante uma turbulência, por exemplo.

Se a percepção individual e o contexto desempenham um papel importante no entendimento do valor percebido, a economia comportamental pode nos dar uma luz para entendê-lo melhor, a partir de um de seus vieses – a Ancoragem. Escolhemos por comparação porque normalmente não sabemos o que realmente queremos (um ponto fundamental e que invalida a teoria econômica tradicional, citada mais acima, ao defender que escolhemos em função dos nossos interesses. Se assim fosse, jamais nos arrependeríamos de alguma decisão já tomada, acredito).

É a ancoragem que nos faz escolher o shampoo mais caro por parecer de melhor qualidade, o carro que parece oferecer mais segurança e conforto, pela comparação dos opcionais entre os diferentes modelos, e a garrafa de preço intermediário na carta de vinhos de um bom restaurante. Se não tivermos referência que contextualize as opções disponíveis, dificilmente teremos parâmetros para decidir (e racionalizar nossas escolhas para nós mesmos).

O valor percebido pode ser tanto quantitativo como qualitativo. Um mesmo produto a um menor preço gera uma satisfação pela economia sentida (valor – monetário – percebido), e um serviço pode surpreender por resolver um problema, atender a uma necessidade, ou amenizar um sentimento negativo (valor qualitativo percebido). Ao gerar valor percebido, inovamos. Ele é um dos três pilares que ajudam a desmistificar o termo inovação, junto com diferenciação e relevância. Essa definição é encontrada em referências clássicas e coincide com o que identifiquei, após as entrevistas para o livro O Efeito Iguana, com apenas uma diferença: os executivos de marketing das grandes empresas confundem valor com vendas.

Enquanto as empresas mais inovadoras enxergam valor como um benefício, utilidade ou satisfação perceptíveis para as pessoas que utilizam seus serviços, as mais conservadores entendem valor como um benefício para elas mesmas, como aumento de faturamento e de lucro. Essa motivação autocentrada as fazem focar em vendas, ao invés de se preocuparem na melhora constante de seus serviços para surpreender as pessoas a quem servem. Valor só se traduz em inovação quando as pessoas o reconhecem, não quando satisfaz a empresa. E vender deve ser entendido como consequência desse valor, quando percebido por seus clientes.

Apesar de agora entender o termo valor como algo pouco racional, ironicamente, foi o valor percebido na matemática que me fez escolher a faculdade de engenharia. Ela foi muito útil quando eu tinha por volta de nove anos de idade. Na época, os supermercados reajustavam os preços de seus produtos diariamente, pela inflação galopante. E não havia cartão de crédito para pagar as compras, cujo total sofria variações frequentes (se você tem vinte e poucos anos de idade talvez não saiba que esse episódio realmente aconteceu). Era complicado prever quanto daria a conta e saber se o dinheiro seria suficiente. Para poupar minha mãe de constrangimentos (de ter que devolver algum produto) fazia mentalmente as contas de cada item que entrava no carrinho para avisá-la quanto seria o total, justo antes de chegar ao caixa. Assim, ela teria tempo de retirar antecipadamente algum item que ultrapassasse o dinheiro disponível.

Acredito que por ter visto o benefício da matemática na prática, como ferramenta, orientei minha decisão para uma profissão que a tinha como base. Talvez, essa noção de valor percebido poderia ser incorporada também nas escolas, tornando matérias mais abstratas, como a própria matemática, em algo mais tangível ao estimular a percepção da sua utilidade no dia a dia. Entendimento do que significa realmente valor deve servir para repensarmos a forma sobre como fazemos aquilo que estamos acostumados a fazer, a fim de aumentar a satisfação a quem servimos e queremos surpreender.

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