Na celebração dos 30 anos da Consumidor Moderno, um dos grandes nomes da economia brasileira subiu ao palco para receber uma homenagem mais do que simbólica. Gustavo Franco, economista e um dos idealizadores do Plano Real, representou uma conquista coletiva que mudou para sempre os rumos do Brasil: o fim da hiperinflação.
Em sua fala, ele destacou que a homenagem era, na verdade, para o time que tornou possível essa transformação – um grupo de profissionais que, ao longo de anos, conduziu um processo contínuo de gestão e ajuste até estabilizar a moeda e pavimentar o caminho para uma nova era no consumo.
Onde tudo começou
Como apontado por Roberto Meir, CEO do Grupo Padrão e idealizador da Consumidor Moderno na celebração de 30 anos da publicação, o consumidor moderno – mais consciente, exigente e seletivo – só foi possível devido ao Plano Real.
Afinal, com o fim dos ciclos de hiperinflação e com uma economia com maior estabilidade, o consumidor passou a ter mais poder de compra, de decisão e de escolha. “Tudo o que vivemos hoje começou com o Plano Real”, afirma Meir.
Além da integrar a equipe responsável pela criação de um dos planos de estabilização econômica mais extraordinários do mundo, Gustavo Franco também presidiu o Banco Central brasileiro com maestria, focado na preservação da maior conquista do brasileiro: o valor da nossa moeda.
Com bom humor e espírito crítico, Gustavo falou sobre os desafios do passado, os aprendizados de sua trajetória e o que espera da economia e do consumidor brasileiro nos próximos 30 anos.
Confira a entrevista exclusiva!
Homenagem ao Plano Real
Consumidor Moderno: O que significa para você receber essa homenagem nos 30 anos da Consumidor Moderno?
Gustavo Franco: A homenagem vai para o Plano Real, do qual eu sou um representante com muita honra. É claro que ela é para um grupo muito grande de pessoas. O Plano Real não é bem um plano, mas um processo de gestão continuada durante vários anos, com muita gente envolvida no dia a dia, resolvendo problemas. Então, sou parte de um time. E hoje, num evento como esse, é como se eu levantasse a taça por esse time.
CM: O que mais marcou a sua trajetória como economista?
Sem dúvida, o Plano Real foi o maior desafio e a experiência de uma vida. Reformas monetárias são raras, e viver e vencer uma hiperinflação é algo ainda mais raro. Isso muda tudo: o país, as pessoas, o mercado. Reinventa estruturas e cria coisas novas, como essa celebração que nos reúne hoje.
CM: Olhando para trás, quais foram os grandes desafios enfrentados naquela época?
Acho que acertamos no desenho institucional das autoridades monetárias e na própria construção da moeda. Era uma questão de o Brasil adotar um modelo consagrado internacionalmente. E o mais impressionante é ver o que aconteceu com o país depois da cura da inflação. Hoje estamos celebrando algo que nem existia naquela época: esse ecossistema de experiência do consumidor. Durante a hiperinflação, nada disso era possível.
Próximos desafios
CM: Se naquela época o grande desafio era a inflação, quais são os principais desafios hoje?
Eu trabalhei numa doença específica: a hiperinflação. E uma vez resolvida, é claro que ela não soluciona todos os problemas. Às vezes, ouvimos um tom de cobrança: “Vocês resolveram a inflação, mas não resolveram a pobreza ou a segurança pública”. Calma, fizemos uma parte muito difícil. Sobre outros problemas, não sei se tenho o que dizer, não são minha especialidade.
CM: Ainda assim, o fantasma da inflação parece sempre rondar. Por quê?
Porque o trauma foi muito grande. O Brasil tem uma cicatriz enorme da hiperinflação. Mesmo uma inflação baixa pode assustar. É como o vício em álcool ou drogas – estamos sóbrios há 30 anos, mas um pouquinho daquele veneno pode nos desestabilizar. Não se pode brincar com isso.
CM: E olhando para os próximos 30 anos, o que você enxerga?
Acho que os próximos 30 anos serão ainda melhores. Aprendemos muito desde 1994 e construímos instituições mais sólidas. A economia é dinâmica. Naquela época, nem sabíamos o que viria com a internet, com o mundo digital, com as redes sociais. Hoje o cenário é diferente – e mais veloz. E nós, como nação, estamos mais preparados. Podemos atingir um progresso maior, mais rápido.