Platão, um dos mais importantes pensadores da Grécia Antiga, já dizia: “a necessidade é a mãe da inovação“. Em outras palavras, o que o filósofo quis dizer é que a capacidade humana de se adaptar e criar soluções a partir de desafios enfrentados mostra como a inovação é, muitas vezes, impulsionada por situações que: ou são de escassez, ou surgem por demandas específicas. Isso significa que, de tempos em tempos, as pessoas são forçadas a pensar fora da caixa.
Mas, afinal, o que é inovação? E como ela vem impactando as relações consumeristas?
Tem empresa que pensa que inovação é simplemente mudança. Entretanto, Tim Cook, CEO da Apple, diz que o caminho não é por aí. “Inovação é sobre melhorar as coisas”, explicou ele. E foi justamente com esse intuito que o Machado Meyer Advogados promoveu, no dia 29 de agosto, o Innovation Summit. O evento, liderado pela sócia do Machado Meyer Juliana Abrusio, especialista em Direito Digital e Proteção de Dados, contou com o apoio da Dell Technologies, FTI Consulting e Microsoft.
Na oportunidade, ficou óbvio que a Inteligência Artificial (IA) está exigindo que as organizações reavaliem suas estratégias de mercado, bem como a forma como interagem com seus consumidores. E se por um lado ela tem facilitado o acesso à informação e permitido uma personalização sem precedentes no relacionamento entre marcas e clientes, por outro ela traz inúmeros obstáculos.
Um deles pode ser percebido nas organizações que ainda operam com sistemas legados que dificultam a integração de novas tecnologias. E, para que a IA seja eficaz, é necessário investir em programas que permitam a coleta, o armazenamento e o processamento de grandes volumes de dados. Outro desafio significativo é a escassez de profissionais qualificados. Há uma demanda crescente por pessoas que dominem a IA e a análise preditiva, mas a oferta ainda é insuficiente.
A questão ética também se destaca como outro empecilho, não menos importante que os demais. Com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) cada vez mais em voga, o uso de IA pode levantar preocupações relacionadas à proteção de informações sensíveis e à privacidade. Mas não é só: questões como discriminação algorítmica e transparência nas decisões automatizadas fazem com que várias organizações sigam desalinhadas com normas éticas.
“Nós não precisamos mais olhar o futuro para adivinhar como será o profissional ou a empresa do amanhã, porque na verdade, mais do que especulação, hoje nós vivemos um testemunho do que já está acontecendo”, comentou Juliana Abrusio na abertura do Innovation Summit. “Então, aquela distopia do passado começa a se delinear hoje, mostrando-nos como serão os próximos anos e décadas. Sem dúvida nenhuma, a empresa e o profissional que estiverem empoderados com IA farão a diferença”.
A Thomson Reuters lançou seu relatório “Futuro dos Profissionais 2024“, com mais de 2.200 profissionais das áreas jurídica, tributária e de risco e conformidade. Os entrevistados preveem que a IA economizará até 12 horas por semana nos próximos cinco anos. Em outras palavras, serão 200 horas anuais. O comedimento corresponde a um aumento significativo na produtividade. Em prática, ele equivale a adicionar um colega para cada 10 membros da equipe. Para advogados nos Estados Unidos, isso pode resultar em cerca de US$ 100 mil em horas adicionais faturáveis.
O interesse crescente em IA está impulsionando a inovação em diversos setores, com 77% dos profissionais acreditando que a IA terá um impacto transformador em seu trabalho nos próximos anos, um aumento de 10 pontos percentuais em relação ao ano anterior, e 79% prevendo um aumento na inovação em suas empresas. “Aqui eu grifo: 77% dos respondentes acreditam que haverá um alto impacto na sua carreira e no seu trabalho. Esses números fazem mais diferença se compararmos com o mesmo relatório do ano passado, em que 67% deram a mesma resposta”, enalteceu Juliana Abrusio.
Na sequência, Juliana passou a palavra para Edison Borges, diretor corporativo da Microsoft, que destacou o quanto a IA generativa está acelerada para todos os segmentos. “Mas é na na área jurídica que ela toma uma proporção fenomenal”. Edison então enfatizou que a implementação da IA generativa no setor jurídico não apenas otimiza processos, mas também tem o potencial de transformar a forma como os profissionais atuam. Ferramentas de automação podem analisar milhões de documentos em questão de minutos, permitindo que advogados se concentrem em tarefas mais estratégicas e de maior valor, o que será de grande valia tanto para empresas quanto para consumidores.
E mais: a tecnologia facilita a pesquisa jurídica, oferecendo insights relevantes e economizando tempo precioso. “Fato é que está todo mundo querendo fazer uso da IA, mas as pessoas não sabem nem ainda diferenciar a IA generativa da IA preditiva. E eu compartilho aqui uma visão do Satya Nadella, CEO da Microsoft, que disse assim: “nós vivemos grandes ondas da tecnologia, e elas mudaram a forma como nós trabalhos, curtimos, interagimos e experimentamos o nosso dia a dia. Então, lá atrás, tínhamos sistemas chamados de cliente-servidor. Depois, veio a internet, cuja primeira versão foi sofrível. Não muito tempo depois, surgiu o smartphone e aquele site que as empresas tinham para a web não abriam mais no celular. Isso significa que todo mundo teve que se adaptar. Resultado: os aplicativos se tornaram febre, dentro e fora das organizações”, recordou Edison Borges.
E, agora, disse ele, “nós estamos surfando a nova onda, da IA generativa”. Ela vai transformar todas as interfaces de conversa em linguagem natural. “Não tem menu, não tem botão, não tem mais nada. A interface será uma conversa na linguagem natural”.
A Microsoft e o LinkedIn, no relatório “Índice de Tendências de Trabalho 2024“, intitulado “A IA já chegou ao trabalho. Agora vem a parte difícil”, revelaram que a IA está transformando rapidamente o ambiente de trabalho global. Os pesquisadores observaram um aumento significativo nas competências em IA adicionadas aos perfis dos profissionais, e muitos líderes já consideram essencial a contratação de talentos com essas habilidades.
A adoção de IA no ambiente de trabalho é crescente, com 75% dos trabalhadores intelectuais globalmente, e 83% no Brasil, utilizando a tecnologia. Esses colaboradores destacam que a IA facilita a economia de tempo, estimula a criatividade e permite foco em tarefas mais relevantes. No entanto, 79% dos líderes globais, e 87% dos brasileiros, reconhecem a importância da IA para a competitividade, mas 59% temem em quantificar sua contribuição para a produtividade. Já 60% sentem que suas empresas carecem de um plano de implementação adequado, situação que se observa em 51% das empresas brasileiras.
Após apresentar um mapeamento das pesquisas, um dos painéis do Innovation Summit tratou o tema “Inovação Responsável: Garantindo a Segurança da Informação“. Na prática, foram apontados os pontos de atenção que todos devem ter com a novas tecnologias, principalmente com relação a dados. Compuseram a mesa os seguintes palestrantes: Antonio Celso, diretor da Dell Technologies; Antonio Gesteira, diretor administrativo sênior da FTI Consulting; e Mihran Kahvedjian Junior, executivo de compliance e gestão de riscos e superintendente & DPO do Banco Santander. A moderação da atividade ficou a cargo de Juliana Abrusio, sócia da área de Direito Digital do Machado Meyer.
Na oportunidade, ficou claro que enfrentar os desafios que estão porvir requer um esforço colaborativo e a disposição das empresas para evoluírem em um cenário tecnológico em constante mudança. Os debatedores concordam que, com a “abordagem certa”, a IA pode transformar não apenas os processos internos, mas também a forma como as empresas interagem com seus clientes e o mercado em geral.
Um dos focos do painel foi a cibersegurança. Afinal, a crescente dependência de tecnologias digitais e a transição para ambientes de trabalho remoto ampliaram a superfície de ataque, tornando a proteção de dados um tema crítico. “Como é que vocês, na Dell, tem apoiado os clientes nessa jornada de cibersecurity?”, perguntou Juliana Abrusio a Antonio Celso, que explicou o seguinte: “Todas as vezes que ocorre um ataque, os clientes me procuram, porque o meu departamento é o responsável pelo suporte na empresa. E o que nós temos notado, cada vez mais, é que a investida hacker não visa a área de TI da empresa. E esse é o principal ponto. O ataque visa destruir a reputação da empresa“.
E, uma vez que é utilizado o termo “reputação”, Antonio Celso recomenda às empresas a importância de envolver outras áreas, além de TI, no plano de preparo e prevenção para um eventual ataque. Em seu parecer, cada área pode oferecer “visão única e contribuições valiosas” para a criação de um plano robusto de resposta a incidentes. “A colaboração interdepartamental é crucial, pois permite que a empresa compreenda os diferentes impactos de um ataque e desenvolva estratégias abrangentes que considerem a continuidade dos negócios”.
Outra recomendação é a implementação de canais de comunicação internos claros. Em caso de um ataque, é vital que haja uma linha de comunicação ágil entre as equipes para a troca de informações e decisões rápidas. A transparência também é essencial na comunicação externa. Manter funcionários e o público informados pode ajudar a preservar a confiança na marca e mitigar os danos à reputação.
No que tange aos bancos, a Resolução nº 4.893 do Conselho Monetário Nacional (CMN) estabelece a política de segurança cibernética. Em suma, ela traz os requisitos para a contratação de serviços de processamento, armazenamento de dados e computação em nuvem. E essas diretrizes devem ser seguidas pelas instituições autorizadas a operar pelo Banco Central do Brasil. Neste sentido, Mihran Kahvedjian Junior, tratou sobre como conciliar inovação com cibersegurança. Em sua fala, ele destacou a importância de uma abordagem integrada que considere tanto a proteção de dados quanto a necessidade de evolução tecnológica.
Enfatizando que a cibersegurança não deve ser vista como um obstáculo, mas como um “facilitador que permite a inovação segura”, Mihran Kahvedjian Junior considera fundamental que as instituições adotem uma cultura de segurança que permeie todos os níveis organizacionais. Em outras palavras, vale promover treinamentos regulares e uma conscientização contínua sobre as ameaças cibernéticas.
“O setor financeiro é um dos mais atacados pelo cibercrime. Precisamos ter isso em mente. E um dos motivos para isso é a monetização. Em síntese, os dados hoje, bem sabemos, são ativos que têm valor tanto para nós quanto para o mercado”. Diante desse cenário, Kahvedjian Junior conclui que a cibersegurança deve ser considerada uma “prioridade estratégica”, integrando-se aos objetivos de negócio. “Somente assim será possível garantir não apenas a proteção contra incidentes, mas também a confiança dos clientes e a sustentabilidade das operações no ambiente financeiro contemporâneo”.
O Legal Ops assegura o planejamento do departamento, administra as finanças e gerencia os projetos por meio da tecnologia. Ademais, o Legal Ops integra diversas operações, permitindo que os setores concentrem-se nas atividades jurídicas cotidianas. Antonio Gesteira, da FTI Consulting e especialista em Legal Ops, recomenda que as empresas utilizem a técnica para adotar uma abordagem proativa em relação à segurança da informação. Ele sugere a implementação de políticas claras sobre o uso de dados. Sem deixar de lado, óbvio, os treinamentos regulares com a equipe para aumentar a conscientização sobre ameaças cibernéticas.
O especialista também destaca a importância de realizar auditorias frequentes nos sistemas e processos de segurança. “Isso garante que medidas adequadas estejam em vigor para proteger informações sensíveis”, argumentou Gesteira. Outro ponto crucial é a escolha de ferramentas tecnológicas confiáveis, que possibilitem a proteção de dados e garantam a conformidade com regulamentações como a LGPD.
Adicionalmente, Antonio Gesteira enfatizou a necessidade de um plano de resposta a incidentes, que permita à empresa agir rapidamente em caso de ataques ou violações de segurança. Esse plano deve incluir responsabilidades bem definidas para cada membro da equipe e protocolos claros para a comunicação interna e externa. Por fim, foi aconselhada também por ele a criação de um ambiente colaborativo. “A ideia é fazer com que as equipes jurídicas e de TI trabalhem juntas para identificar riscos e implementar soluções eficazes. Essa sinergia é vital para fortalecer a segurança organizacional e minimizar vulnerabilidades que possam comprometer a integridade dos dados empresariais”.
No Innovation Summit, foi ministrado ainda o seguinte painel: “Inovação na Advocacia: Desvendando o Impacto da Inteligência Artificial e suas aplicações“. Na oportunidade, foi explicado como as transformações oriundas da IA podem ser usadas de forma positiva e facilitadora no dia a dia de trabalho. Por fim, o último painel trouxe reflexão e prováveis respostas sobre “Advocacia 4.0: O Futuro da Profissão do Advogado“, mostrando o que a sociedade pode esperar dos profissionais e da lei nesse cenário de rápidas inovações tecnológicas, as quais geram grandes impactos no meio empresarial.
O painel que tratou a inovação na advocacia contou com os seguintes debatedores: Fernanda de Figueiredo Funck, diretora jurídica da Microsoft; Fernanda Chaguri, diretora jurídica e de consumidor na Vivo; e Thiago Miranda, diretor de inovação no Machado Meyer. Na mediação, Milene Coscione e Thais Matallo Cordeiro, respectivamente, sócias das áreas de Telecomunicações e de Direitos das Relações de Consumo do Machado Meyer Advogados.
Na oportunidade, especialistas deixaram claro que uma das aplicações mais promissoras da IA na advocacia é a revisão de contratos. Softwares de IA são capazes de identificar cláusulas, riscos e inconsistências em uma fração do tempo que um humano levaria, garantindo maior precisão e menor margem de erro. Além disso, como a tecnologia oferece sugestões para melhorias, automaticamente os contratos vão ficando mais robustos e alinhados às necessidades das partes. Outra área em crescente uso é a análise preditiva, que utiliza dados históricos para prever resultados de litígios. Advogados podem, assim, oferecer a seus clientes uma análise mais fundamentada sobre as chances de sucesso em um processo, auxiliando na tomada de decisões estratégicas, incluindo a possibilidade de acordos.
O último painel do Summit, que tratou a Advocacia 4.0, contou com os seguintes debatedores: Alexandre Pacheco da Silva, professor de Direito na FGV; Daniel Marques, diretor da AB2L; e Danilo Limoeiro, co-founder e CEO da Turivius.com. A mediação ficou a cargo de Caroline Marchi e Sávio Pereira de Andrade, nessa ordem, sócia da área trabalhista e coordenador da célula de inovação do Machado Meyer Advogados .
Nele, ficou perceptível que IA melhora sim o acesso à justiça. Isso porque a utilização de IA permite a automação de tarefas repetitivas, análise de grandes volumes de dados e a predição de resultados de litígios. Além disso, a implementação de sistemas de gestão de processos eletrônicos tem revolucionado a forma como os advogados interagem com o judiciário. Tais sistemas facilitam o monitoramento de prazos, o acompanhamento de andamentos processuais e a gestão documental, minimizando erros e melhorando a organização interna.
No entanto, a integração da IA na advocacia não é isenta de desafios. Questões éticas relacionadas à privacidade de dados, viés algorítmico e responsabilidade legal ainda precisam ser abordadas. As empresas devem adotar uma postura proativa em relação à formação e preparação de seus profissionais para lidarem com essas novas tecnologias e suas implicações.
É imprescindível que a advocacia entenda não apenas as vantagens oferecidas pela IA, mas também a necessidade de sua implementação de maneira responsável. Concluindo, o impacto da IA na advocacia é profundo e multifacetado. Dessa forma, ao adotar essas inovações, as empresas não apenas se modernizam, mas também se posicionam à frente em um mercado que valoriza a agilidade e a precisão. O futuro da advocacia será, sem dúvida, marcado por uma sinergia entre a expertise humana e a capacidade tecnológica, promovendo uma nova era de serviços jurídicos.
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